Introdução
O livro “História da Redenção” de Ellen G. White é um texto fundamental para os seguidores do adventismo, oferecendo uma visão detalhada da narrativa bíblica e da obra de Deus ao longo da história. No entanto, sua interpretação e aplicação teológica levantam uma série de desafios e questionamentos que merecem uma análise crítica. Este post examina os principais pontos controversos e as implicações teológicas apresentadas na obra, destacando como eles se relacionam com a ortodoxia cristã e as doutrinas bíblicas. Através desta análise, buscamos entender melhor as tensões entre as interpretações de Ellen White e as tradições teológicas estabelecidas, promovendo um debate mais profundo sobre a fé e a interpretação das Escrituras.
Capítulo 1: A Criação e a Queda
Trecho do Livro: “Antes de Satanás ter sido criado, o céu era um lugar de grande paz e felicidade. Deus havia feito tudo perfeito, mas Satanás, em sua inveja, começou a semear discórdia entre os anjos.”
Análise Teológica:
- Interações Celestiais: A descrição de Ellen White sobre a interação de Satanás antes da criação é mais detalhada do que o relato bíblico. Gênesis 1 e 2 apresentam a criação e a queda de maneira resumida e direta, sem detalhamentos extensivos sobre Satanás e a discórdia entre os anjos.
- Fundamentação Bíblica: Gênesis 1:31 – “E Deus viu tudo o que havia feito, e eis que era muito bom.” A Bíblia descreve a criação como perfeita e boa, sem detalhar eventos específicos sobre Satanás ou interações celestiais antes da criação.
Capítulo 2: O Dilúvio e a Aliança com Noé
Trecho do Livro: “A arca tinha medidas exatas dadas por Deus e todos os tipos de animais foram cuidadosamente preservados. Não havia erros na construção, e a arca era grande o suficiente para todos os animais que entraram nela.”
Análise Teológica:
- Dilúvio Global: A descrição detalhada das medidas da arca e a preservação dos animais fornecidas por Ellen White são mais elaboradas do que o relato bíblico. Gênesis fornece as dimensões básicas da arca e a preservação dos animais de maneira resumida.
- Fundamentação Bíblica: Gênesis 6:15 – “Esta é a forma que farás a arca: de trezentos côvados será o comprimento da arca, de cinquenta côvados a largura, e de trinta côvados a altura.” O texto bíblico oferece medidas básicas e essenciais da arca, sem entrar em detalhes adicionais sobre a preservação dos animais.
Capítulo 3: A Vida de Abraão e a Formação da Nação de Israel
Trecho do Livro: “Abraão frequentemente conversava com Deus em visão e era instruído sobre o futuro da sua descendência e da nação de Israel, com detalhes sobre o comportamento dos seus descendentes.”
Análise Teológica:
- Vida de Abraão: Ellen White adiciona detalhes sobre as conversas e instruções de Deus a Abraão que não estão explicitamente descritos em Gênesis. O relato bíblico de Abraão concentra-se em eventos principais e promessas sem detalhamentos extensivos.
- Fundamentação Bíblica: Gênesis 15:4 – “Então veio a palavra do Senhor a ele, dizendo: Não será este o teu herdeiro; mas aquele que sair de teus lombos será o teu herdeiro.” O texto bíblico oferece a promessa sem detalhes extensivos sobre instruções futuras.
Capítulo 4: A Vida de Moisés e a Lei de Deus
Trecho do Livro: “Moisés recebeu uma revelação detalhada da Lei de Deus, incluindo explicações adicionais sobre o propósito dos rituais e as leis cerimoniais.”
Análise Teológica:
- Lei de Deus: Ellen White oferece uma visão detalhada das revelações e dos propósitos das leis que pode ir além do que é explicitamente revelado na Bíblia. A Lei de Deus é descrita em Êxodo e Levítico com foco em suas implicações espirituais e morais.
- Fundamentação Bíblica: Levítico 11:1-2 – “E o Senhor falou a Moisés e a Arão, dizendo-lhes: Fala aos filhos de Israel, dizendo: Estes são os animais que comereis de entre todos os animais da terra.” A Bíblia descreve as leis alimentares e rituais, mas não fornece explicações adicionais extensivas sobre seus propósitos.
Capítulo 5: A Vida de Davi e a Promessa do Messias
Trecho do Livro: “A promessa do Messias a Davi incluía revelações detalhadas sobre os eventos futuros e o impacto de seu reino.”
Análise Teológica:
- Promessa Messiânica: Ellen White expande a promessa messiânica com detalhes que não estão explicitamente descritos em 2 Samuel. A Bíblia promete que o Messias viria da linhagem de Davi, mas não fornece uma explicação extensiva sobre eventos futuros.
- Fundamentação Bíblica: 2 Samuel 7:12-13 – “Quando teus dias forem cumpridos e estiveres dormindo com teus pais, eu levantarei depois de ti a tua descendência, que sairá de teus lombos, e estabelecerei o seu reino. Ele edificará uma casa ao meu nome, e eu estabelecerei para sempre o trono do seu reino.” O texto bíblico foca na continuidade do reino sem detalhes extensivos sobre eventos futuros.
Capítulo 6: A Vida de Cristo e o Ministério
Trecho do Livro: “Os milagres de Cristo foram realizados com propósitos específicos e instruções detalhadas dadas aos discípulos sobre como interpretá-los.”
Análise Teológica:
- Milagres e Ministério: Ellen White pode adicionar interpretações aos milagres de Cristo que não são explicitamente encontradas nos evangelhos. Os evangelhos relatam os milagres de Cristo, mas o foco está mais na evidência de sua divindade e poder do que em interpretações detalhadas.
- Fundamentação Bíblica: João 20:30-31 – “Na verdade, Jesus fez muitos outros sinais na presença dos seus discípulos, que não estão escritos neste livro; mas estes foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome.” A Bíblia apresenta os milagres como sinais da identidade de Cristo, sem entrar em interpretações detalhadas.
Capítulo 7: A Morte e Ressurreição de Cristo
Trecho do Livro: “Jesus enfrentou uma grande batalha espiritual durante sua morte e ressurreição, com detalhes sobre os conflitos internos e externos enfrentados.”
Análise Teológica:
- Morte e Ressurreição: Ellen White pode detalhar uma batalha espiritual que não é explicitamente descrita nos evangelhos. O relato bíblico da morte e ressurreição de Cristo é mais focado na narrativa dos eventos e na importância teológica do ato.
- Fundamentação Bíblica: Lucas 23:46 – “E, clamando Jesus com uma grande voz, disse: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito. E, dizendo isto, expirou.” A Bíblia descreve a morte de Cristo como uma entrega de espírito sem detalhar uma batalha espiritual interna ou externa.
Capítulo 8: A Ascensão e o Papel do Espírito Santo
Trecho do Livro: “A ascensão de Cristo foi acompanhada por eventos celestiais e instruções específicas sobre o papel do Espírito Santo, que foram reveladas a um pequeno grupo.”
Análise Teológica:
- Ascensão e Espírito Santo: Ellen White pode adicionar eventos celestiais e instruções sobre o Espírito Santo que não são explicitamente descritos em Atos dos Apóstolos. A Bíblia relata a ascensão e a vinda do Espírito Santo com foco nas promessas e no impacto do Espírito.
- Fundamentação Bíblica: Atos 1:9 – “E, dizendo estas coisas, foi elevado às alturas, à vista deles, e uma nuvem o recebeu e o ocultou aos seus olhos.” O relato bíblico da ascensão é direto e não detalha eventos celestiais extensivos.
Capítulo 9: O Julgamento e a Vida Eterna
Trecho do Livro: “O julgamento final será acompanhado por uma revisão detalhada das ações humanas e suas consequências eternas, com detalhes sobre o processo de julgamento.”
Análise Teológica:
- Julgamento e Vida Eterna: Ellen White pode expandir a descrição do julgamento final e suas consequências com detalhes que não são explicitamente descritos em Apocalipse. A Bíblia descreve o julgamento final de forma mais resumida, focando na justiça divina e nas consequências eternas.
- Fundamentação Bíblica: Apocalipse 20:12 – “E vi os mortos, grandes e pequenos, em pé diante de Deus; e abriram-se livros, e outro livro foi aberto, que é o livro da vida; e os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras.” O texto bíblico fornece um resumo do julgamento final, sem detalhes extensivos sobre o processo.
Capítulo 10: A Restauração Final e a Nova Terra
Trecho do Livro: “A nova terra será criada com todas as características desejadas pelos justos, e a restauração será um processo detalhado, com características específicas que refletem os desejos dos justos.”
Análise Teológica:
- Restauração e Nova Terra: Ellen White pode adicionar detalhes sobre a criação da nova terra e as características desejadas pelos justos que não são explicitamente descritos em Apocalipse. A Bíblia descreve a nova terra de maneira mais geral, enfatizando a restauração e a promessa de uma nova criação.
- Fundamentação Bíblica: Apocalipse 21:1 – “E vi um novo céu e uma nova terra; porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe.” O texto bíblico descreve a nova criação sem detalhes extensivos sobre características específicas.
A Cristologia Controversa de Ellen G. White
Ellen G. White, co-fundadora da Igreja Adventista do Sétimo Dia, é uma figura central e controversa no adventismo. Sua alegada capacidade de receber visões e mensagens divinas formou a base de muitas doutrinas adventistas. No entanto, uma análise crítica de seus escritos revela inconsistências significativas, especialmente em sua compreensão e representação de Jesus Cristo.
A Natureza Mutável do Cristo de Ellen White
Inicialmente, os escritos de White apresentavam uma visão quase ariana de Cristo, retratando-o como um ser criado, inferior a Deus Pai. No livro “História da Redenção”, ela escreve:
“O pai então fez saber que por sua própria decisão Cristo seu filho devia ser considerado igual a ele, de modo que em qualquer lugar que estivesse presente seu filho isso valeria pela sua própria presença.” (História da Redenção, p. 17)
Esta passagem sugere que a igualdade de Cristo com Deus não era inerente, mas concedida, contradizendo a doutrina cristã ortodoxa da divindade eterna de Cristo.
Cristo como Ser Angelical
White frequentemente equiparava Jesus a seres angelicais, particularmente ao Arcanjo Miguel:
“Miguel ou Cristo com os anjos que sepultaram Moisés desceu do céu depois de ter permanecido no túmulo por pouco tempo e o ressuscitou levando-o para o céu.” (Spiritual Gifts, Volume 3, p. 92)
Esta identificação de Jesus como um arcanjo é incompatível com a doutrina cristã tradicional da natureza plenamente divina de Cristo.
O Propósito da Encarnação
Segundo White, o propósito principal da vinda de Cristo ao mundo era vingar a lei de Deus, não primariamente salvar a humanidade:
“Ele morreu para vindicar a honra da Lei… A morte de Cristo testificou que a lei é imutável que é eterna como O Trono de Deus.” (The Signs of the Times, 17 de julho de 1893)
Esta visão contrasta com a ênfase bíblica na salvação e redenção como o propósito central da encarnação de Cristo.
A Natureza Humana de Cristo
White apresentava visões contraditórias sobre a natureza humana de Cristo. Por um lado, ela afirmava:
“Nada havia nele que correspondesse aos sofismas de Satanás… O mesmo se pode dar conosco.” (O Desejado de Todas as Nações, p. 87)
Sugerindo que Cristo tinha uma natureza sem pecado e que os crentes poderiam alcançar o mesmo estado. Por outro lado, ela também escreveu:
“Apesar de os pecados de um mundo culpado terem sido lançados sobre Cristo, apesar da humilhação de tomar sobre si a nossa natureza decaída…” (Desire of Ages, p. 112)
Indicando que Cristo assumiu uma natureza humana caída.
A Incerteza de Cristo Sobre Sua Ressurreição
Talvez uma das afirmações mais controversas de White seja a sugestão de que Cristo não tinha certeza de sua ressurreição:
“A esperança não lhe apresentava a saída da Sepultura como vencedor nem lhe falava da aceitação do sacrifício por parte do pai. Temia que o pecado fosse tão ofensivo a Deus que sua separação houvesse de ser eterna.” (O Desejado de Todas as Nações, p. 662-663)
Esta declaração contradiz diretamente as próprias palavras de Jesus nos evangelhos, onde ele prediz sua morte e ressurreição.
O Retorno de Cristo Condicionado à Perfeição dos Crentes
White ensinou que o retorno de Cristo estava condicionado à perfeição moral dos crentes adventistas:
“Quando o caráter de Cristo for perfeitamente reproduzido em seu povo, então ele virá para reclamá-los como seus próprios.” (Christ’s Object Lessons, p. 69)
Esta ideia não encontra respaldo nas Escrituras e parece contradizer a doutrina da graça.
A Continuação do Sacrifício de Cristo
Contrariando a doutrina cristã do sacrifício completo de Cristo na cruz, White sugeriu que o processo de expiação continuava:
“Quando se arrepender do pecado, confessar e abandonar, então o perdão é registrado a favor do nome do pecador, mas seus pecados não são apagados até depois do juízo investigativo.” (The Signs of the Times, 16 de maio de 1895)
Satanás como Aquele que Carrega Nossos Pecados
Talvez a mais controversa das doutrinas de White seja a ideia de que Satanás, não Cristo, levaria os pecados finais do povo de Deus:
“Como O sacerdote ao remover do Santuário os pecados confessava o sobre a cabeça do bode emissário, semelhantemente Cristo porá todos esses pecados sobre Satanás, o originador e instigador do pecado.” (O Grande Conflito, p. 485)
Esta doutrina parece diminuir a eficácia do sacrifício de Cristo e atribuir um papel redentor a Satanás.
Influências Literárias e Culturais
As visões de White sobre o conflito celestial e a natureza de Cristo parecem ter sido influenciadas por obras literárias populares de sua época, como “O Paraíso Perdido” de John Milton, e possivelmente pelas crenças dos mórmons. Isso levanta questões sobre a originalidade e a inspiração divina de suas visões.
10. Evolução das Visões de White
Ao longo de sua vida, as visões de White sobre Cristo evoluíram, aproximando-se mais da ortodoxia cristã em seus escritos posteriores. No entanto, essa evolução levanta questões sobre a confiabilidade de suas primeiras “visões” e a natureza de sua suposta inspiração divina.
A análise dos escritos de Ellen G. White revela inconsistências significativas em sua cristologia. Suas representações de Jesus Cristo frequentemente divergem da doutrina cristã ortodoxa e, em alguns casos, contradizem diretamente as Escrituras. A evolução de suas visões ao longo do tempo, juntamente com as aparentes influências literárias e culturais, levanta questões sérias sobre a natureza e a origem de suas “revelações”.
Essas inconsistências e contradições são particularmente problemáticas considerando a posição de White como profetisa e autoridade doutrinária na Igreja Adventista do Sétimo Dia. Elas sublinham a importância de um exame crítico e cuidadoso de seus escritos, especialmente quando comparados com as Escrituras e a doutrina cristã histórica.
Este estudo sugere que, longe de ser uma fonte confiável de verdade espiritual, os escritos de White sobre Cristo são profundamente problemáticos e potencialmente enganosos. Os crentes, especialmente dentro da tradição adventista, são encorajados a examinar criticamente essas doutrinas à luz das Escrituras e da tradição cristã mais ampla.