Introdução
A Lição 11, intitulada “Conflito iminente”, aborda a interpretação adventista das profecias de Apocalipse 13 sobre a besta do mar e a besta da terra. Ela conecta essas bestas com a Igreja Católica Romana e os Estados Unidos, respectivamente, e prevê um conflito final centrado na adoração e na guarda do sábado.
Embora a lição levante questões importantes sobre fidelidade a Deus em tempos de crise, suas interpretações proféticas específicas são distintamente adventistas e diferem significativamente da compreensão da maioria dos estudiosos bíblicos protestantes. Como cristãos comprometidos com o princípio da Sola Scriptura, devemos fundamentar nossas doutrinas escatológicas no claro ensino das Escrituras, não em sistemas proféticos especulativos.
Domingo: O Conflito Final do Apocalipse
A lição corretamente aponta que a adoração é um tema central no livro de Apocalipse, destacando o contraste entre a adoração ao Criador (Apocalipse 14:7) e a adoração à besta (Apocalipse 13:4).[1] A batalha final será de fato uma batalha por fidelidade e adoração.
No entanto, a lição então faz a afirmação dogmática de que “a besta usa o engano e, quando isso falha, usa a força e a coerção”, e que “no fim dos tempos, Deus terá um povo leal a Ele, apesar da oposição e perseguição mais feroz da história”.[1] Embora a possibilidade de perseguição futura seja real, a certeza e a natureza específica desses eventos são menos claras no texto bíblico do que a lição sugere.
Segunda: A Crise Vindoura
A lição adverte sobre uma futura “marca da besta” imposta por lei, incluindo sanções econômicas e até um decreto de morte para os que se recusam a recebê-la.[1] Ela cita Ellen White predizendo um tempo em que “os observadores dos mandamentos serão ameaçados de multa, prisão e morte”.[1]
Embora a Bíblia certamente preveja um tempo de provação para o povo de Deus (por exemplo, Daniel 12:1; Mateus 24:21), as interpretações específicas da lição sobre a “marca da besta” são baseadas mais nas especulações de Ellen White do que no claro ensino bíblico. A maioria dos estudiosos protestantes entende a “marca” em um sentido mais simbólico, representando fidelidade ou lealdade aos poderes anticristãos, não necessariamente como uma marca literal imposta por lei.[2]
Terça e Quarta: Identificando a Besta
A lição identifica a “besta do mar” de Apocalipse 13 como a Igreja Católica Romana, argumentando que ela cumpre as características proféticas de receber autoridade do dragão (v. 2), falar blasfêmias (v. 1, 6), e perseguir os santos por “42 meses” (v. 5), interpretados como 1260 anos.[1]
Embora essa interpretação seja tradicional dentro do adventismo, ela não é a conclusão da maioria dos estudiosos bíblicos protestantes. Muitos veem a “besta” em um sentido mais geral, representando poderes políticos e religiosos anticristãos ao longo da história, não exclusivamente a Igreja Católica.[3] A identificação dogmática da lição vai além do que o texto bíblico explicitamente afirma.
Quinta: A Besta da Terra
A lição identifica a “outra besta” de Apocalipse 13:11 como os Estados Unidos, argumentando que ele cumpre as características de surgir por volta do fim do domínio da primeira besta em 1798, ter uma aparência inicial de cordeiro mas depois falar como dragão, e liderar o mundo na adoração da primeira besta.[1]
Novamente, embora essa interpretação seja tradicional no adventismo, ela não é a conclusão da maioria dos intérpretes protestantes. A aplicação de detalhes proféticos simbólicos a uma nação específica séculos após a composição do Apocalipse é altamente problemática do ponto de vista hermenêutico.[4] Tal identificação dogmática vai muito além do que o texto bíblico clara e explicitamente diz.
Conclusão
Em resumo, a Lição 11 apresenta interpretações proféticas que são distintamente adventistas em perspectiva e que diferem da compreensão bíblica da maioria dos estudiosos protestantes. Embora a lição corretamente enfatize temas importantes como fidelidade a Deus e preparação para tempos difíceis, suas identificações dogmáticas da “besta do mar” e da “besta da terra” estão abertas a questionamentos.
Como cristãos comprometidos com o princípio da Sola Scriptura, devemos fundamentar nossas doutrinas escatológicas nas claras afirmações da Palavra de Deus, não em sistemas proféticos complexos que vão além do que o texto bíblico explicitamente revela. Embora sejamos sábios em estar vigilantes e preparados para a oposição, também devemos ser cautelosos em fazer pronunciamentos dogmáticos sobre os detalhes e o momento dos eventos finais.
Que o Espírito de Deus nos dê discernimento ao estudarmos as profecias de Sua Palavra, sabedoria para distinguir entre o claro e o especulativo, e graça para amar e testemunhar fielmente por Cristo, não importa o que o futuro traga. Nossa esperança está firmada não em cronogramas ou cenários específicos, mas na fidelidade Daquele que prometeu estar conosco “todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mateus 28:20).
Referências:
[1] Lição da Escola Sabatina Adulta, 2º trimestre de 2024, lição 11.
[2] G. K. Beale, The Book of Revelation, NIGTC (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1999), 715-717.
[3] Craig S. Keener, Revelation, NIVAC (Grand Rapids, MI: Zondervan Academic, 2000), 336-337.
[4] Steve Gregg, ed., Revelation: Four Views, A Parallel Commentary (Nashville, TN: Thomas Nelson, 2013), 292-294.
Correções Importantes:
Aqui estão 10 razões bíblicas, teológicas e acadêmicas pelas quais a interpretação adventista do decreto dominical, o conspiracionismo contra os Estados Unidos e a Igreja Católica, e a exclusão dos cristãos que adoram no domingo são problemáticos:
1. Falta de base bíblica clara: A ideia de um futuro decreto dominical universal imposto pela Igreja Católica e apoiado pelos Estados Unidos não é explicitamente ensinada na Bíblia. Essa interpretação depende de uma leitura altamente alegórica e especulativa de passagens apocalípticas como Apocalipse 13, que a maioria dos estudiosos bíblicos entende como se referindo a realidades do primeiro século, não a eventos específicos do fim dos tempos.[1]
2. Ir além da Sola Scriptura: O princípio protestante da Sola Scriptura afirma que a Bíblia é a autoridade final e suficiente para a doutrina cristã.[2] No entanto, as teorias adventistas sobre o decreto dominical e a identificação das “bestas” de Apocalipse 13 dependem fortemente dos escritos de Ellen White, não do claro ensino bíblico. Como observa o teólogo protestante Anthony Hoekema: “A doutrina do decreto dominical… não se origina da Bíblia, mas dos escritos de Ellen G. White.”[3]
3. Especulação profética: A tentativa de encaixar nações e instituições modernas em profecias bíblicas altamente simbólicas é hermeneuticamente problemática. Como adverte o estudioso bíblico G. K. Beale: “Deve-se ter cuidado para não identificar muito rapidamente os eventos contemporâneos com as profecias do Apocalipse… Tal abordagem corre o risco de ler mais nos detalhes simbólicos do que o texto justifica.”[4]
4. Desconsideração da natureza apocalíptica: Apocalipse pertence ao gênero apocalíptico, caracterizado por linguagem simbólica, hipérbole e imagens cósmicas.[5] Interpretar suas visões como predições literais de eventos futuros específicos desconsidera as convenções desse gênero. Como explica o estudioso do Novo Testamento Grant Osborne: “O simbolismo exagerado e a linguagem extravagante são características da apocalíptica e apontam para a natureza figurativa das visões.”[6]
5. Menosprezo da unidade do corpo de Cristo: A ideia de que apenas aqueles que adoram no sábado serão o verdadeiro povo de Deus nos últimos dias menospreza a unidade do corpo de Cristo e exclui injustamente a vasta maioria dos cristãos sinceros ao longo da história. Como afirma o teólogo Millard Erickson: “Insistir que aqueles que observam o domingo estão recebendo a marca da besta parece um estreitamento indevido do povo de Deus e uma ruptura da unidade do corpo de Cristo.”[7]
6. Desconsideração da liberdade cristã: O Novo Testamento afirma a liberdade dos cristãos em relação a dias e práticas cerimoniais (Romanos 14:5-6; Colossenses 2:16-17). Insistir na observância do sábado como uma questão de fidelidade nos últimos dias parece inconsistente com esse princípio. Como observa o teólogo D. A. Carson: “Paulo resistiu vigorosamente a todos os esforços por impor o sabbath aos cristãos gentios… Ele temia que, se os cristãos gentios começassem a observar os dias especiais do calendário judaico, logo cairiam na escravidão a todo o sistema judaico.”[8]
7. Legalismo potencial: Enfatizar a guarda do sábado como a marca definitiva da fidelidade nos últimos dias corre o risco de promover uma forma de legalismo e justiça própria. Como adverte o teólogo R. C. Sproul: “Devemos ser cautelosos para não permitir que a observância do sábado se torne um novo legalismo… Nossas obras de obediência devem fluir da graça de Deus, não ser um meio de ganhar Seu favor.”[9]
8. Falta de perspectiva histórica: A ideia de que a adoração dominical se originou como uma conspiração anticristã ignora as evidências da celebração cristã do domingo já no século II, bem antes de Constantino ou do surgimento do papado.[10] Como observa o historiador da igreja Justo González: “Pelo tempo de Justino [meados do século II], a observância do domingo parece ter sido uma prática estabelecida e inquestionável, recebida da geração anterior.”[11]
9. Promoção da desconfiança e divisão: As teorias da conspiração sobre um decreto dominical futuro promovem uma atitude de suspeita e paranoia em relação a outras denominações cristãs e instituições civis. Isso solapa a confiança, o diálogo e a cooperação. Como adverte o teólogo Mark Noll: “Perigos específicos do conspiracionismo incluem… a erosão da confiança social e uma propensão a demonizar oponentes.”[12]
10. Foco desviado do evangelho: Em última análise, uma preocupação excessiva com especulações escatológicas sobre decretos futuros e perseguição desvia o foco da igreja da proclamação do evangelho da graça de Deus em Cristo. Como exorta o apóstolo Paulo: “Decidi nada saber entre vocês, a não ser Jesus Cristo, e este, crucificado” (1 Coríntios 2:2). O coração da fé cristã é a obra consumada de Cristo em nosso favor, não nossas próprias obras ou obediência a um suposto teste do tempo do fim.
Em suma, embora os adventistas sinceros possam encontrar significado nessas interpretações, elas carecem de claro fundamento bíblico, desviam-se do consenso da erudição bíblica protestante, promovem a desconfiança e a divisão, e arriscam ofuscar a centralidade do evangelho. Como cristãos bíblicos, somos chamados a fundamentar nossa fé e esperança não em teorias conspiratórias, mas na obra consumada de Cristo e nas promessas claras de Sua Palavra.
Referências:
- [1] Steve Gregg, ed., Revelation: Four Views, A Parallel Commentary (Nashville, TN: Thomas Nelson, 2013), 292-294.
- [2] James R. White, Scripture Alone: Exploring the Bible’s Accuracy, Authority, and Authenticity (Bloomington, MN: Bethany House, 2004), 23-57.
- [3] Anthony A. Hoekema, Seventh-day Adventism (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1963), 167.
- [4] G. K. Beale, The Book of Revelation, NIGTC (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1999), 48.
- [5] Mitchell G. Reddish, ed., Apocalyptic Literature: A Reader (Peabody, MA: Hendrickson, 1995), 19-32.
- [6] Grant R. Osborne, Revelation, BECNT (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2002), 16.
- [7] Millard J. Erickson, Christian Theology, 3rd ed. (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2013), 1118.
- [8] D. A. Carson, From Sabbath to Lord’s Day: A Biblical, Historical and Theological Investigation (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1982), 345.
- [9] R. C. Sproul, Truths We Confess: A Systematic Exposition of the Westminster Confession of Faith, 3 vols. (Orlando, FL: Reformation Trust, 2019), 2:298.
- [10] Samuele Bacchiocchi, From Sabbath to Sunday: A Historical Investigation of the Rise of Sunday Observance in Early Christianity (Rome: The Pontifical Gregorian University Press, 1977), 90-131.
- [11] Justo L. González, A History of Christian Thought, vol. 1, From the Beginnings to the Council of Chalcedon (Nashville: Abingdon Press, 1970), 128.
- [12] Mark A. Noll, “Evangelicals and the Study of the Bible,” in Evangelicalism and Modern America, ed. George Marsden (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1984), 121.