Introdução
Ellen G. White, uma das principais líderes e cofundadora da Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD), é considerada pela denominação como detentora do dom profético. No entanto, ao longo da história do movimento adventista, várias figuras proeminentes expressaram dúvidas e questionamentos sobre a autenticidade de suas visões e testemunhos. Este artigo explora os relatos de pioneiros adventistas, líderes da igreja e até mesmo familiares de Ellen White que manifestaram reservas sobre seu alegado dom profético, destacando a importância de uma análise crítica e bíblica dessas alegações.
Pioneiros Adventistas e suas Dúvidas
Vários pioneiros do movimento adventista, apesar de seu envolvimento direto com Ellen White, expressaram ceticismo em relação às suas visões. Joseph Bates, uma testemunha das primeiras manifestações de Ellen Harmon (nome de solteira de White), admitiu que por muito tempo estava “relutante em acreditar que era algo mais do que o que foi produzido por um estado prolongado e debilitado de seu corpo”1. Somente quando Ellen teve uma visão conveniente sobre astronomia, assunto de interesse de Bates, suas dúvidas foram dissipadas.
J. N. Andrews, outro proeminente pioneiro, foi alvo de uma repreensão de Ellen White por supostamente permitir que “Satanás controlasse sua mente” com dúvidas2. Andrews confessou a Tiago White, marido de Ellen, que os testemunhos lhe causavam tanto “terror e angústia” que ele sentia não poder fazer deles o mesmo uso abençoado que outros faziam3.
Até mesmo Tiago White, cofundador da IASD e esposo de Ellen, demonstrou hesitação em relação a algumas de suas visões. Em um caso específico, Ellen afirmou ter visto que aqueles batizados antes de 1844 precisariam ser rebatizados antes da volta de Cristo4. No entanto, Tiago se recusou a ser rebatizado, alegando que precisaria “examinar a Bíblia a respeito disso”5. Essa postura sugere que ele não considerava todas as visões de sua esposa alinhadas com as Escrituras.
Líderes da Igreja e Questionamentos
Ao longo dos anos, vários líderes da IASD expressaram dúvidas sobre o dom profético de Ellen White. J. N. Loughborough, apesar de seu papel na promoção das visões de Ellen, tinha reservas sobre sua inspiração. Segundo relatos, ele lamentou a publicação de uma declaração de Ellen que parecia contradizer a doutrina bíblica da expiação, afirmando que “isso nunca deveria ter sido impresso”6.
A. G. Daniels, presidente da Associação Geral da IASD, também manifestou questionamentos sobre os testemunhos de Ellen White, especialmente em relação a suas orientações de saúde. Em uma conferência secreta com líderes adventistas em 1919, ele admitiu: “Eu mesmo comi quilos de manteiga e dúzias de ovos em sua mesa. Eu não poderia explicar isso em sua própria família se acreditasse que ela acreditava que aquelas eram as próprias palavras do Senhor para o mundo”7.
Membros da Família e Contemporâneos
Surpreendentemente, até mesmo familiares e contemporâneos próximos de Ellen White expressaram dúvidas sobre seu dom profético. Dos sete irmãos de Ellen, apenas sua irmã Sarah se uniu formalmente à IASD8. Seu filho Edson, por um período, seguiu um caminho independente dos conselhos de sua mãe e chegou a afirmar que não tinha “inclinações religiosas”9. Quando Edson acusou seu irmão Willie de influenciar os testemunhos de Ellen, ela o repreendeu duramente10 e o instou a parar de expressar suas dúvidas, alegando que isso enfraquecia a confiança da igreja na integridade dos Testemunhos11.
Franklin E. Belden, sobrinho de Ellen White e compositor de hinos para a IASD, questionou abertamente sua inspiração, supondo que ela estava sendo influenciada por outros líderes12. Ele teria dito, enquanto trabalhava na Casa Publicadora Adventista: “Eu não soube de uma alma sendo convertida através da leitura de O Grande Conflito”13. Relatos indicam que, pouco antes de sua morte, Belden ainda mantinha suas dúvidas sobre Ellen White14.
Uriah Smith, editor da Review and Herald, principal revista adventista, e sua esposa Harriet também expressaram ceticismo em relação aos testemunhos de Ellen White. Após receber um testemunho que considerou impreciso, Smith escreveu em uma carta: “Parece-me que os testemunhos, na prática, chegaram a tal forma que não adianta tentar defender as afirmações errôneas que agora são feitas a respeito deles”15.
Dúvidas da Própria Ellen White
Surpreendentemente, a própria Ellen White, em certos momentos, pareceu duvidar de sua missão profética. Após o fracasso de suas visões sobre a “porta fechada” no início da década de 1850, ela se tornou menos proeminente por um período. Com exposição pública limitada, suas visões se tornaram menos frequentes até que, em 1855, ela concluiu que seu “trabalho na causa de Deus estava terminado” e que não tinha “mais nenhum dever a cumprir”16.
Além disso, as práticas pessoais de Ellen White em relação ao consumo de carne, uso de joias, devolução do dízimo e outras questões parecem indicar que, por vezes, ela mesma tinha pouca consideração por seus próprios testemunhos17.
A Importância do Teste Bíblico
Diante desses relatos históricos de dúvidas e questionamentos sobre o dom profético de Ellen White, mesmo por parte de pioneiros, líderes e familiares próximos, é crucial que os adventistas do sétimo dia examinem suas alegações à luz das Escrituras. A Bíblia fornece testes claros para avaliar a autenticidade de um profeta, como a coerência com a Palavra de Deus (Isaías 8:20), o cumprimento de suas predições (Deuteronômio 18:22) e a produção de bons frutos (Mateus 7:15-20).
Uma análise honesta e objetiva dos escritos de Ellen White revela inconsistências doutrinárias, erros factuais e influências de fontes não inspiradas18. Suas visões iniciais sobre a “porta fechada da salvação” se mostraram falsas19, e muitas de suas declarações sobre saúde e eventos futuros não se cumpriram conforme o previsto20.
Conclusão
A história do adventismo está repleta de relatos de dúvidas e questionamentos sobre o dom profético de Ellen G. White, partindo não apenas de críticos externos, mas também de pioneiros, líderes e até familiares próximos. Essas expressões de ceticismo, juntamente com as inconsistências e erros encontrados em seus escritos, ressaltam a necessidade de uma avaliação criteriosa de suas alegações à luz do padrão infalível das Escrituras Sagradas.
Como cristãos, nossa fé e prática devem estar firmemente fundamentadas na Palavra de Deus, e não em supostas revelações modernas (2 Timóteo 3:16-17). Embora Ellen White possa ter desempenhado um papel significativo na história da IASD, elevar seus escritos a um status de autoridade quase canônica pode obscurecer a centralidade da Bíblia e criar barreiras desnecessárias para a unidade cristã.
Que possamos, com humildade e discernimento, examinar todas as coisas e reter o que é bom (1 Tessalonicenses 5:21), sempre permitindo que as Escrituras sejam a regra suprema e suficiente de nossa fé e prática.
Referências Bibliográficas:
- 1. BATES, J. A Word to the Little Flock, 1847, p. 21.
- 2. WHITE, E. G. Testimonies, vol. 1, p. 246.
- 3. ANDREWS, J. N. Carta a Tiago White, 2 de fevereiro de 1862.
- 4. WHITE, E. G. Spalding and Megan, p. 3. Visão de 24 de agosto de 1850.
- 5. “Test of Fellowship”, Messenger of Truth, 19 de outubro de 1854, p. 3.
- 6. BROWN, H. Memoirs, 1984.
- 7. Notas da Conferência sobre o Espírito de Profecia, 1919.
- 8. WHITE, E. G. Manuscript 9, 1859.
- 9. WHITE, E. Carta a E. G. White, 18 de maio de 1893.
- 10. WHITE, E. G. Carta 209, 1905.
- 11. WHITE, E. G. Carta 185, 1905.
12. COON, R. Minneapolis – 1888: The “Forgotten” Issue, capítulo 2, 1988. - 13. Ibid.
- 14. Ibid.
- 15. SMITH, U. Carta a D. M. Canright, 22 de março de 1883.
- 16. WHITE, E. G. Review and Herald, 1856, p. 118.
- 17. Conforme examinado ao longo do artigo.
- 18. NUMBERS, R. L. Prophetess of Health: A Study of Ellen G. White, 1976.
- 19. WHITE, E. G. Manuscript Releases, Vol. 5, p. 100.
- 20. Conforme discutido em várias obras críticas sobre Ellen G. White.
- BÍBLIA. Isaías 8:20; Deuteronômio 18:22; Mateus 7:15-20; 2 Timóteo 3:16-17; 1 Tessalonicenses 5:21.