A Ordenança do Sábado na Nova Aliança: Uma Análise Crítica da Perspectiva Adventista

Introdução:

A observância do sábado é um pilar fundamental da doutrina adventista do sétimo dia. Contudo, a ausência de uma ordenança explícita sobre o sábado na Nova Aliança levanta questões sobre sua validade e relevância para os cristãos hoje. Neste artigo, examinaremos criticamente a perspectiva adventista sobre o sábado, explorando os fundamentos bíblicos e teológicos desta crença, bem como as visões de teólogos renomados sobre o assunto.

O Sábado no Antigo Testamento:

O sábado foi instituído por Deus após a criação, como declara Gênesis 2:2-3: “E havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que Deus criara e fizera” [1]. Posteriormente, o mandamento do sábado foi incorporado aos Dez Mandamentos dados a Moisés no Monte Sinai: “Lembra-te do dia do sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás, e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor teu Deus” (Êxodo 20:8-10a) [2].

O teólogo Walter Brueggemann argumenta que o sábado no Antigo Testamento era um sinal da aliança entre Deus e Israel, servindo como um lembrete semanal de sua libertação da escravidão no Egito [3]. Era um dia de descanso, adoração e comunhão com Deus, refletindo a ordem criada por Ele.

Jesus e o Sábado:

Durante seu ministério terreno, Jesus frequentemente se envolveu em discussões sobre a observância adequada do sábado. Ele afirmou que “o sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado” (Marcos 2:27) [4], indicando que o propósito do sábado era beneficiar a humanidade, não sobrecarregá-la com regras rígidas. Jesus também declarou ser “Senhor do sábado” (Mateus 12:8) [5], afirmando sua autoridade sobre a interpretação e aplicação deste dia santo.

O estudioso do Novo Testamento, N.T. Wright, sugere que as ações de Jesus no sábado, como curar os enfermos e permitir que seus discípulos colhessem grãos para comer, eram uma forma de desafiar as interpretações legalistas do sábado que haviam surgido no judaísmo do segundo templo [6]. Jesus buscou restaurar o sábado ao seu propósito original de trazer descanso, cura e libertação.

O Sábado na Igreja Primitiva:

Após a ressurreição de Jesus, os primeiros cristãos, que eram predominantemente judeus, continuaram a observar o sábado junto com o culto no primeiro dia da semana (domingo), que celebrava a ressurreição de Cristo (Atos 20:7; 1 Coríntios 16:2) [7][8]. No entanto, à medida que o evangelho se espalhou para os gentios, surgiram tensões sobre a observância do sábado e outras práticas judaicas.

O apóstolo Paulo abordou essa questão em suas epístolas, enfatizando que os cristãos não estavam mais sob a lei mosaica, incluindo a observância do sábado. Em Colossenses 2:16-17, ele declara: “Ninguém, pois, vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, Que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo” [9]. Paulo argumenta que o sábado era uma sombra ou tipo apontando para a realidade última encontrada em Cristo.

O teólogo reformado, John Calvin, interpretou essas passagens como indicando que a observância do sábado não era mais obrigatória para os cristãos, pois sua substância espiritual havia sido cumprida em Cristo [10]. A liberdade cristã, guiada pelo Espírito Santo, deveria governar a observância de dias especiais.

A Perspectiva Adventista e suas Implicações:

A Igreja Adventista do Sétimo Dia baseia sua doutrina do sábado na crença de que os Dez Mandamentos, incluindo o mandamento do sábado, permanecem vinculativos para os cristãos na Nova Aliança [11]. Eles argumentam que, uma vez que Jesus e os apóstolos observaram o sábado, os cristãos de hoje também devem fazê-lo como um ato de lealdade e obediência a Deus.

No entanto, essa visão enfrenta vários desafios exegéticos e teológicos. Primeiramente, a ausência de uma reafirmação clara do mandamento do sábado no Novo Testamento sugere que ele pode não ser obrigatório para os cristãos gentios. Em segundo lugar, a ênfase de Paulo na liberdade da lei mosaica e sua rejeição do legalismo em relação a dias especiais (Romanos 14:5-6) parecem contradizer a noção de que o sábado permanece como um requisito para os crentes da Nova Aliança [12].

Além disso, a insistência adventista na observância do sábado como um teste de lealdade levanta preocupações sobre a suficiência da obra de Cristo. O teólogo reformado R.C. Sproul argumenta que fazer da guarda do sábado um requisito para a verdadeira adoração e favor de Deus efetivamente nega a doutrina da justificação somente pela fé, acrescentando obras à mensagem do evangelho [13].

Conclusão:

Embora a Igreja Adventista do Sétimo Dia tenha construído sua identidade em torno da observância do sábado, um exame crítico de seus fundamentos bíblicos e teológicos levanta questões significativas sobre a validade e a necessidade desta prática para os cristãos da Nova Aliança. A ausência de uma ordenança explícita do sábado no Novo Testamento, juntamente com os ensinamentos de Paulo sobre a liberdade cristã e a suficiência de Cristo, desafia a noção adventista de que a guarda do sábado permanece obrigatória para os crentes de hoje.

Como cristãos comprometidos com o princípio do Sola Scriptura, devemos permitir que a totalidade do testemunho bíblico, interpretado à luz da pessoa e obra de Cristo, molde nossa compreensão e prática da adoração e do descanso. Embora o conceito de um dia de descanso e renovação espiritual certamente tenha valor, elevá-lo ao status de um teste decisivo de fidelidade arrisca obscurecer a centralidade do evangelho da graça.

Perguntas:

1. Qual é o fundamento bíblico para a instituição do sábado no Antigo Testamento?

Resposta: O fundamento bíblico para a instituição do sábado no Antigo Testamento é encontrado em Gênesis 2:2-3, onde Deus descansa no sétimo dia após a criação e o abençoa, e em Êxodo 20:8-10a, onde o mandamento do sábado é incorporado aos Dez Mandamentos dados a Moisés no Monte Sinai.

2. Como Jesus abordou a questão da observância do sábado durante seu ministério terreno?

Resposta: Durante seu ministério terreno, Jesus se envolveu em discussões sobre a observância adequada do sábado. Ele afirmou que o sábado foi feito para o benefício do homem (Marcos 2:27) e declarou ser o Senhor do sábado (Mateus 12:8). Suas ações no sábado, como curar os enfermos, desafiaram as interpretações legalistas que haviam surgido no judaísmo.

3. De que maneira a prática do sábado se desenvolveu na igreja primitiva, particularmente em relação aos crentes gentios?

Resposta: Na igreja primitiva, os primeiros cristãos, sendo predominantemente judeus, continuaram a observar o sábado junto com o culto no primeiro dia da semana (domingo), que celebrava a ressurreição de Cristo (Atos 20:7; 1 Coríntios 16:2). Contudo, à medida que o evangelho alcançava os gentios, surgiram tensões sobre a observância do sábado e outras práticas judaicas. O apóstolo Paulo abordou essa questão, enfatizando que os cristãos não estavam mais sob a lei mosaica, incluindo a observância do sábado (Colossenses 2:16-17).

4. Quais são algumas das principais objeções teológicas à visão adventista da guarda do sábado como obrigatória para os cristãos hoje?

Resposta: Algumas das principais objeções teológicas à visão adventista da guarda do sábado como obrigatória para os cristãos hoje incluem: a) A ausência de uma reafirmação clara do mandamento do sábado no Novo Testamento. b) A ênfase de Paulo na liberdade da lei mosaica e sua rejeição do legalismo em relação a dias especiais (Romanos 14:5-6). c) A preocupação de que insistir na observância do sábado como um teste de lealdade possa negar a doutrina da justificação somente pela fé, acrescentando obras à mensagem do evangelho.

5. À luz da suficiência da obra de Cristo e da doutrina da justificação somente pela fé, é apropriado tratar a observância do sábado como um teste de lealdade e obediência a Deus? Explique sua resposta.

Resposta: Tratar a observância do sábado como um teste decisivo de lealdade e obediência a Deus pode ser problemático à luz da suficiência da obra de Cristo e da doutrina da justificação somente pela fé. A ênfase bíblica na Nova Aliança é que a salvação é alcançada pela graça mediante a fé em Jesus Cristo, não pela adesão a dias especiais ou práticas específicas. Embora a observância do sábado possa ter valor como um princípio espiritual de descanso e renovação, elevá-la ao status de um requisito para a verdadeira adoração e favor de Deus arrisca obscurecer a centralidade do evangelho e a liberdade que os crentes têm em Cristo. Ultimately, nossa lealdade e obediência devem ser direcionadas a Jesus, reconhecendo que é somente por meio dele que somos justificados e aceitos por Deus.

Referências:

[1] Gênesis 2:2-3
[2] Êxodo 20:8-10a
[3] Brueggemann, W. (2014). Sabbath as Resistance: Saying No to the Culture of Now. Westminster John Knox Press.
[4] Marcos 2:27
[5] Mateus 12:8
[6] Wright, N. T. (2011). Simply Jesus: A New Vision of Who He Was, What He Did, and Why He Matters. HarperOne.
[7] Atos 20:7
[8] 1 Coríntios 16:2
[9] Colossenses 2:16-17
[10] Calvin, J. (2017). Institutes of the Christian Religion. Hendrickson Publishers.
[11] Douty, N. F. (1968). Another Look at Seventh-Day Adventism. Baker Book House.
[12] Romanos 14:5-6
[13] Sproul, R. C. (1998). Faith Alone: The Evangelical Doctrine of Justification. Baker Books.

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