A doutrina do juízo investigativo tem fundamento bíblico sólido?

Resposta:

A doutrina do juízo investigativo é um ensino distintivo da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Segundo essa doutrina, a partir de 1844 Cristo entrou no Lugar Santíssimo do santuário celestial para fazer uma obra de purificação e julgamento, examinando os registros de todos os que professaram crer em Deus ao longo da história para determinar quem é digno da vida eterna. No entanto, um exame cuidadoso das Escrituras levanta questões sobre a base bíblica dessa doutrina.

Um texto chave usado para apoiar o juízo investigativo é Daniel 8:14: “Ele me disse: Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; então o santuário será purificado.” Adventistas interpretam isso como se referindo à purificação do santuário celestial, que teria começado em 1844. No entanto, o contexto de Daniel 8 parece indicar que a visão se refere a eventos relacionados ao período dos impérios Medo-Persa e Grego, e à subsequente profanação do templo por Antíoco Epifânio, não a eventos no céu no século XIX.

Outro texto usado é Apocalipse 14:7, que fala da hora do juízo de Deus. Mas o contexto indica que esse juízo ocorre em conexão com a segunda vinda de Cristo, não um julgamento investigativo antes dela.

Uma passagem que parece ir contra a ideia de um juízo investigativo é Hebreus 9:27-28: “Da mesma forma, como o homem está destinado a morrer uma só vez e depois disso enfrentar o juízo, assim também Cristo foi oferecido em sacrifício uma única vez, para tirar os pecados de muitos; e aparecerá segunda vez, não para tirar o pecado, mas para trazer salvação aos que o aguardam.” Esse texto liga o julgamento à morte, não a uma data específica na história. E afirma que Cristo aparecerá uma segunda vez para trazer salvação, não para fazer um julgamento investigativo.

Outro problema é que a doutrina do juízo investigativo pode dar a entender que nossa salvação depende de nossa performance e registro de obras, e não somente da graça de Deus e da obra expiatória de Cristo. Mas Efésios 2:8-9 deixa claro: “Pois vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus; não por obras, para que ninguém se glorie.”

Alguns textos usados para apoiar a ideia de um julgamento pelas obras, como Apocalipse 20:12 (“Vi também os mortos, grandes e pequenos, em pé diante do trono, e livros foram abertos. Outro livro foi aberto, o livro da vida. Os mortos foram julgados de acordo com o que tinham feito, segundo o que estava registrado nos livros.”) se referem ao julgamento final, não a um juízo investigativo antes da volta de Cristo.

É verdade que a Bíblia fala que devemos todos comparecer perante o tribunal de Cristo (2 Coríntios 5:10) e que Deus trará a julgamento tudo o que está oculto (Eclesiastes 12:14). Mas esses textos não estabelecem a ideia de um juízo investigativo celestial a partir de uma data específica.

A Bíblia não parece ensinar que nossa salvação fica “pendente” até um juízo investigativo celestial. Pelo contrário, textos como 1 João 5:12-13 indicam que podemos ter certeza da vida eterna no presente: “Quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho de Deus, não tem a vida. Escrevi-lhes estas coisas, a vocês que creem no nome do Filho de Deus, para que vocês saibam que têm a vida eterna.”

Além disso, a doutrina do juízo investigativo depende de uma interpretação muito específica do simbolismo do santuário celestial e de profecias como Daniel 8:14. Mas a aplicação desses símbolos a um processo de julgamento pré-advento a partir de 1844 não é uma conclusão necessária ou clara dos textos bíblicos.

Por fim, a noção de um juízo investigativo parece diminuir a eficácia da obra de Cristo. Hebreus 10:14 diz: “Pois por um único sacrifício ele aperfeiçoou para sempre os que estão sendo santificados.” Se a obra de Cristo foi suficiente para nos aperfeiçoar, que necessidade há de um juízo adicional para determinar nossa salvação?

Portanto, embora a doutrina do juízo investigativo tente harmonizar diversos conceitos bíblicos, um exame mais detalhado mostra que ela vai além do claro ensino das Escrituras. A Bíblia não estabelece claramente a ideia de um julgamento celestial a partir de 1844. Nossa segurança e esperança devem estar firmadas na obra consumada de Cristo e nas promessas de Deus, não no resultado de um suposto processo judicial no céu. Como cristãos, aguardamos com esperança o dia em que Cristo voltará para trazer juízo e galardão, e para receber Seu povo para Si.